A capital mineira deixou há muito tempo de ser referência na gestão dos resíduos da construção e demolição, pela falta de atenção de seus governantes e por uma estrutura engessada, algo natural em se tratando de órgão público.
O modelo de BH se junta às unidades de reciclagem de RCD de Betim/MG, São Carlos/SP, São José do Rio Preto/SP, Campinas/SP, João Pessoa/PB e Guarulhos/SP.
A gestão de usinas de reciclagem de entulho exige dinamismo e atenção, especialmente porque na maior parte do país o aumento na geração de resíduos pela população não acompanhou o aumento no número de locais para o descarte desse resíduo.
O modelo público, mais precisamente o de Belo Horizonte, desafia os números. A Pesquisa Setorial Abrecon 2017/2018, única a apresentar dados do setor de RCD, mostrou que esse tipo de empreendimento, gerido pela Prefeitura, representa 4% das iniciativas no Brasil.
No início da década de noventa as Prefeituras já se perguntavam o que fazer com esse material – o entulho. A cidade de São Paulo foi a pioneira na implantação de uma usina de reciclagem e Aterro de Inertes na Zona Sul. A experiência, no entanto, não durou muito tempo.
Outras cidades, assim como a capital paulista construíram suas unidades seguindo um modelo mofino sem condições de vender ou aplicar o agregado reciclado em obras públicas.
Muito se evoluiu nesses últimos anos. Apenas como exemplo: o formato de recepção de resíduos já não é aquele usado na década de noventa, bem como, a tecnologia já domina boa parte do processo de gerenciamento numa unidade de reciclagem de RCD.
O órgão público ficou para trás e o mais curioso é que modelos como esses ainda sobrevivem sem ao menos alguém perceber que é inócuo, caro e extremamente ineficiente.
O desenho de uma usina de reciclagem de entulho pública é assim: recebe tudo, não tria, brita e classifica um resíduo. Sim, resíduo, não é agregado reciclado.
Numa oportunidade em 2013 pude conhecer o procedimento de recepção e britagem de uma empresa pública em São Paulo: dramático.
Era impossível entender aquilo. O ápice da apresentação foi o “agregado reciclado” sendo utilizado numa perenização de estrada rural (termo utilizado para um método mais rudimentar de pavimentação sem camadas de compactação). No vídeo dava para ver o vento levando pedaços de plásticos, papéis e até folhas.
Da forma como o entulho entrava no britador, ele saía. A ideia não era digerível para as pessoas leigas, pois em muitos casos os donos das propriedades próximas às estradas que eram pavimentadas reclamavam da quantidade de lixo na via em época de chuva e até de caminhões com pneus furados em virtude de pregos e vidros estarem no leito viário.
Assim, as usinas públicas não desempenham o seu papel no processo de gestão dos resíduos da construção, ao contrário, estimulam a criação de uma miríade de ATT’s (Áreas de Transbordo e Triagem), a comercialização dos resíduos para aterramento e nivelamento topográfico, além de prejudicar o desenvolvimento do mercado de agregado reciclado.
Em Belo Horizonte, referência na reciclagem de resíduos da construção na última década, carimbada por inúmeros profissionais da área e matéria jornalista de muitos jornais especializados, a questão chegou a um ponto crítico, pois das três usinas da SLU – Superintendência de Limpeza Urbana de BH, duas estão desativadas e a única usina em operação não consegue atender a demanda de toda a cidade.
A política para o setor de resíduos da construção em Belo Horizonte foi especialmente inteligente no seu início, mas mostra-se insustentável e frugal nos dias de hoje. Isso é resultado da falta de atenção do poder público para a área, limitação orçamentária e de foco da Superintendência de Limpeza Urbana – SLU.
O custo de manutenção das unidades de reciclagem de entulho de BH, mesmo aquelas desativadas, espanta qualquer desavisado.
Assim, muitos modelos públicos jazem por não serem operacionais, tais como Sumaré/SP, Hortolândia/SP, Tupã/SP, Rancharia/SP, Campos dos Goytacazes/RJ, Armação de Búzios/RJ, Lençóis Paulista/SP e tantos outros.
As usinas de reciclagem de entulho com gestão pública carecem de uma série de ações para alcançarem a sustentabilidade financeira, caso contrário, padecerão frente aos seus próprios obstáculos.
Levi Torres
Coordenador da ABRECON